Capítulo 4: A Ferrovia: o motor da transformação

A geografia e a distância eram, nos primórdios da colônia, grandes desafios para Ijuí. A produção, por mais abundante que fosse, encontrava obstáculos intransponíveis para alcançar os mercados consumidores. Nesse contexto, a chegada da ferrovia não foi apenas uma melhoria logística; foi uma revolução, um "motor da transformação" que rompeu o isolamento, impulsionou a economia e redefiniu a própria dinâmica de crescimento da cidade.

4.1. A chegada da estrada de ferro: um marco em 1911

A virada do século XIX para o XX no Brasil foi marcada pela expansão da malha ferroviária, um símbolo do progresso e da modernização. Para Ijuí, o ano de 1911 seria indelével, pois seria o ano da chegada dos trilhos que ligariam a colônia ao restante do estado e do país. A construção dessa via férrea não foi um processo simples, mas uma empreitada que mobilizou recursos e mão de obra, gerando grande expectativa na população.

Em 1907, a cidade vizinha de Cruz Alta, um ponto estratégico e já conectado por ferrovia, recebeu com grande entusiasmo o 2º Batalhão de Infantaria. A missão desse batalhão era clara e de importância vital: construir a linha férrea que ligaria a região à distante Colônia de Ijuí. O início das obras, em 15 de abril de 1908, marcou o começo de um período de intensa atividade. A população local, ciente dos potenciais benefícios que a nova via de transporte traria, acompanhava de perto cada quilômetro de trilho assentado, cada ponte construída, ansiosa pela promessa de um futuro mais conectado e próspero.

A inauguração da primeira estação, em Alto da União, em 1910, foi um prelúdio do que viria. O apito do trem e o vapor das locomotivas eram presságios de uma nova era. Em 1911, o tão aguardado momento finalmente chegou: a Estação de Ijuí foi inaugurada. Esse evento não foi apenas a abertura de uma nova linha de transporte; foi um "marco fundamental para o desenvolvimento urbano e econômico da cidade", um verdadeiro "antes e um depois" para toda a região. O isolamento começava a ceder lugar à conectividade, abrindo um leque de novas possibilidades para a economia e para a vida social de Ijuí.

4.2. Impactos da ferrovia: escoamento, investimentos e industrialização

A chegada da ferrovia a Ijuí não trouxe apenas a possibilidade de um transporte mais eficiente; ela desencadeou uma série de transformações em cadeia que redefiniram a economia e a estrutura urbana da cidade. Seus impactos foram múltiplos e profundos:

Em primeiro lugar, o escoamento da produção agrícola foi revolucionado. A agricultura, base da economia local, até então dependia de meios rudimentares e lentos para levar seus produtos aos mercados. Com a ferrovia, o transporte de grãos, erva-mate, produtos beneficiados e outros gêneros agrícolas tornou-se mais rápido, mais barato e em maior volume. Essa eficiência logística permitiu que os produtores ijuiense acessassem mercados distantes, como a Argentina para a erva-mate, e outras localidades no Rio Grande do Sul e até mesmo no país. O maior alcance dos mercados incentivou o aumento da produção e a diversificação das culturas, impulsionando a economia rural e gerando mais riqueza para os colonos.

Além disso, a ferrovia atuou como um poderoso ímã para investimentos. A facilidade de escoamento e de recebimento de matérias-primas e insumos tornou Ijuí um local atrativo para o capital. Esse influxo de investimentos, por sua vez, impulsionou a industrialização da cidade. Empresários e empreendedores viram na localização de Ijuí, agora conectada à rede ferroviária, um potencial enorme para instalar fábricas e beneficiar a produção local.

Um exemplo notável desse processo foi o surgimento dos primeiros núcleos de desenvolvimento urbano e industrial nas áreas próximas à estação ferroviária. O Frigorífico Serrano, um dos estabelecimentos industriais mais antigos da região, instalou-se em uma posição estratégica, aproveitando a logística férrea para o transporte de seus produtos. A presença dessas indústrias, por sua vez, gerou um aumento na demanda por mão de obra, atraindo mais pessoas para a cidade.







Viação Férrea em Ijuhy - 1911

A ferrovia, ao facilitar tanto o transporte de mercadorias quanto o de pessoas, também contribuiu decisivamente para a expansão da cidade em direção às áreas coloniais. Essa expansão não foi apenas física, mas também social e econômica, pois integrou a zona rural e a urbana. Os colonos do interior tinham agora um acesso mais fácil ao centro urbano, aos seus serviços, ao seu comércio e às suas indústrias. Essa integração fomentou o crescimento populacional, com mais pessoas se estabelecendo em Ijuí e seus arredores, consolidando-a como um polo de desenvolvimento e atração na região. A ferrovia, assim, não foi apenas uma linha de trem, mas uma artéria vital que bombeou vida e prosperidade para Ijuí.

4.3. Infraestrutura viária: ruas e expansão urbana

Apesar do impacto revolucionário da ferrovia, o desenvolvimento de Ijuí não se restringiu apenas aos trilhos de aço. A "dinâmica de crescimento da cidade esteve intrinsecamente ligada à sua infraestrutura viária", que compreendia as ruas e estradas que conectavam o núcleo urbano ao seu vasto interior e a outras localidades. Essas vias, muitas vezes subestimadas, desempenharam um "papel crucial na expansão urbana" e na consolidação de Ijuí como um centro regional.

Nos primórdios da colônia, as "picadas" abertas na mata eram as únicas vias de comunicação. Com o tempo, essas picadas evoluíram para "estradas vicinais", que permitiam o trânsito de carroças e o escoamento da produção agrícola das colônias para o centro urbano. Essas estradas eram vitais para a subsistência dos colonos, garantindo o transporte de seus produtos (grãos, laticínios, madeira, etc.) para os moinhos, serrarias e armazéns da cidade, e o retorno com bens de consumo e insumos.

A construção e manutenção dessas ruas e estradas não foi uma tarefa fácil, especialmente considerando as condições topográficas e os recursos limitados da época. No entanto, o esforço em expandir e melhorar essa malha viária foi constante. A gestão dos intendentes e prefeitos dedicou-se à construção de pontes sobre rios e arroios, à abertura de novos trechos e à pavimentação, ainda que rudimentar, das vias mais importantes.

Essa rede viária facilitou não apenas o transporte de mercadorias e a mobilidade da população, mas também impulsionou o povoamento de áreas mais afastadas do núcleo central. Novos bairros e comunidades rurais surgiram ao longo dessas estradas, expandindo o perímetro urbano e rural da colônia. A facilidade de acesso incentivou a instalação de mais propriedades rurais e, consequentemente, o aumento da produção agrícola, que encontrava nas estradas o caminho para a ferrovia e, dali, para mercados mais amplos.

Em suma, a infraestrutura viária atuou como um complemento essencial à ferrovia, garantindo a capilaridade necessária para o pleno desenvolvimento de Ijuí. As ruas e estradas, embora menos glamorosas que os trens, foram os vasos capilares que distribuíram a vitalidade econômica por todo o território do município, integrando campo e cidade e consolidando a Ijuí atual, que floresceu em seu ponto estratégico, como um polo regional robusto e bem conectado.